quarta-feira, 2 de setembro de 2015

"Sai daí muleque, ciclofaixa é coisa de comunista", disse o motorista

Por Lucas Fernando Amorim

"ah, esses ciclistas são mesmo uns vagabundos!"

Quem nunca ouviu isso que atire a primeira roda. Ao longo dos anos, todo mundo sabe que a tendencia - mundial, talvez - é de cada vez mais incentivar o uso da bicicleta.
Mas, contudo, entretanto e um pouco mais de mas, Recife (e em sua maioria no Brasil) parece que ainda os motoristas não entenderam a lógica da coisa de viver em sociedade. Ou entenderam a lógica da coisa e não estão nem aí mesmo. Afinal, ar condicionado, um sonzinho tranquilão, o conforto e a ~good vibe~ que o carro proporciona é mais importante, é melhor que se preocupar com besteirol de ciclofaixa, faixa exclusiva de ônibus e mobilidade urbana voltada pro coletivo. Essa última, acredito que nunca se passou pela cabeça de alguns motoristas de carro.

O problema é o carro em si? Talvez não. Acredito que o maior problema é a falta de organização no trânsito. A falta de um planejamento na mobilidade urbana da cidade faz com que a gente fique duas horas dentro de um ônibus e mais uns ~bons e generosos~  minutos esperando-os.  Além disso tudo, existe, especificamente e principalmente em Recife, o conhecido, famoso e legitimado cartel das empresas de ônibus (um bom assunto pra outro dia) que não realizam manutenção nos busão, que não tratam seus trabalhadores com respeito nem com salários e auxílios dignos. E ainda nos fazem pagar um valor absurdo na tarifa (que não deveria existir). Enquanto o poder municipal e estadual de Recife e Pernambuco, ambos governados pelo PSB, se ausentarem de criar políticas públicas que realmente mudem nosso transito e ignorarem completamente a situação das Integrações, Terminais e Estações de ônibus e metrô e se submeterem ao poder empresarial e capitalista dos empresários, nada mudará. E nossa cidade continuará ocupando o primeiríssimo lugar de pior transito do país, aquele onde se perde mais tempo parado. Só em 2014 foram 103 horas parado em congestionamento e 27 minutos parado no pico diário de congestionamento. É muito tempo.




                                                         (Imagem: Camila Sugai)

Enquanto se incentivar o uso de carro, a compra desgovernada, continuaremos vivendo numa cidade onde se derruba casas (geralmente de pessoas pobres) para se construir avenidas e avenidas. E continuaremos ter nossa biodiversidade, como o mangue, sendo vitima de bizarrices como a construção milionária da Via Mangue, em Recife.

Por isso que a luta por um transporte digno é muito mais que uma luta apenas contra a lotação do ônibus ou aquele engarrafamento que nos atrasou pra universidade, a luta por uma mobilidade urbana digna é também uma luta contra o status quo atual, uma luta que tenta destruir o sistema de troca de favor entre político e empresário que tanto prejudica o trabalhador e os estudantes. É uma luta sim da classe trabalhadora e estudantil. É uma luta pelo direito de ir e vir com qualidade e segurança.

É também uma luta para democratizar o espaço urbano da cidade que é tão ocupado pelo individualismo contemporâneo. Individualismo esse que representa o próprio sistema capitalista em si: provedor do "eu", do "ter", em detrimento da falta do "nosso" e do "coletivo". Repensar nossa organização de mobilidade urbana é repensar o próprio modelo de sociedade que querem construir. Uma pluralizada e diversa, em que todos, bikes, onibus, metrô, inclusive os carros, tenham espaços democráticos dentro da cidade.  Ou uma cidade em que apenas alguns tenham direito de ir e vir  e transitar na cidade com qualidade e o individualismo capitalista siga comandando tudo?

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